A chuva de novembro vai lavando o Padrão

Os mesmos pingos que banham o Tribunal de Sintra

E antes caíram no Campus da Justiça

No mesmo mês, em que começou a chover fósforo na Palestina

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A chuva não lava o silêncio, fá-lo o poder

A chuva escorre a tinta que tenta gritar

Pingos de cor em paredes para lembrar o passado

Pingos de cor em tecido para destacar o presente

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(Dizem-nos, que) a culpa é da tinta e não de quem celebra sem memória

(Dizem-nos, que) a culpa é de quem resiste

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A chuva na calçada faz-me escorregar, a caminho da vigília

E me pergunto:

Será que, acabando o fósforo, vão querer construir um Padrão?

De navegadores sem barcos, mas de drones?

Esculturas a partir dos vídeos do tiktok?

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E será que nesse dia, o Campo das Cebolas vai continuar como está hoje?

Em que a chuva não molha o monumento porque está há anos por construir?

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E será que havendo outro Padrão, o de Lisboa vai querer ser um monumento irmão?

Ou vai querer escolher a revolução?

Mariana RP Alves[1]Mariana R.P. Alves escreve e publica este poema a título próprio, refletindo a sua visão do mundo e não necessariamente a das suas afiliações institucionais. Mariana é atualmente investigadora … Continue a ler

08.12.2023

Pema escrito em resposta à proposta de escrita coletiva (com Danilo Cardoso e Aua Embaló) de carta ao Padrão dos Descobrimentos no âmbito de oficina de educação antirracista “Educação Antirracista: Consciência Histórica, Direitos Humanos e Propostas de Ação” que integra o Ciclo InFormAção do Grupo EducAR.

Perante a proposta de escrita de carta ao padrão, o poema é o resultado da inevitabilidade que a autora sentiu de cruzar o simbolismo colonial do Padrão dos Descobrimentos em Lisboa com a luta antirracista na mesma cidade (particularmente o caso de injustiça e violência policial contra Cláudia Simões e o adiamento sem fim da construção de um monumento de homenagem às pessoas escravizadas) e com a violência relacionada com a ocupação, apartheid e genocídio da/na Palestina pelo “Estado de Israel” e aliados.

References
1 Mariana R.P. Alves escreve e publica este poema a título próprio, refletindo a sua visão do mundo e não necessariamente a das suas afiliações institucionais. Mariana é atualmente investigadora pós-doutoral no Centro de Investigação em Didática e Tecnologias na Formação de Formadores (Universidade de Aveiro) e co-diretora pro-bono da associação sem fins lucrativos Cartas com Ciência (www.cartascomciencia.org).

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