Vanessa Andreotti 1, Sharon Stein 1, Dino Siwek 2, Camilla Cardoso 2, Tereza Caikova 1, Ubiracy Pataxó 3, Benicio Pitaguary 4, Rosa Pitaguary 4, Ninawa Huni Kui 5, Elwood Jimmy 6

 

Resumo: Neste artigo, revisamos aprendizados de nossos esforços colaborativos para o engajamento com decolonização em diversos contextos educacionais. Para isso, consideramos múltiplas interpretações sobre decolonização e múltiplas dimensões de teorias e práticas decoloniais – em particular as dimensões ecológica, cognitiva, afetiva, relacional e econômica. Ao invés de oferecer definições normativas ou prescrições, procuramos fomentar uma ampliação da sensibilidade para potenciais circularidades, curto-circuitos e contradições do pensamento crítico, e identificar oportunidades e aberturas para experimentos coletivos contextualizados e responsáveis, em direção a outras possibilidades de (co)existência. Dessa forma, enfatizamos uma abordagem pedagógica para a decolonização que reconhece o papel do inconsciente, da complexidade, da cumplicidade e das incertezas neste tipo de trabalho.

Palavras-chave: Decolonização, Pedagogia, Modernidade, Colonialismo.

Resumen: En el presente artículo, revisamos aprendizajes derivados de nuestros esfuerzos colaborativos para el compromiso con la descolonización en diversos contextos educativos. Para eso, consideramos múltiples interpretaciones sobre descolonización y múltiples dimensiones de teorías y prácticas descolonizadas – en particular, las dimensiones ecológica, cognitiva, afectiva, relacional y económica. En lugar de ofrecer definiciones normativas o prescripciones, procuramos fomentar una ampliación de la sensibilidad para potenciales circularidades, cortocircuitos y contradicciones del pensamiento crítico, e identificar oportunidades y aberturas para experimentos colectivos contextualizados y responsables, hacia otras posibilidades de (co)existencia. Así, enfatizamos un abordaje pedagógico para la descolonización que reconoce el papel de la complexidad, de la complicidad y de las incertidumbres en este tipo de trabajo.

Palabras-clave: Descolonización; Pedagogía; Modernidad; Colonialismo.

 

Abstract:  In this paper, we review learnings from our collaborative efforts to engage with decolonization in various educational contexts. For this, we consider multiple interpretations of decolonization and multiple dimensions of decolonial theories and practices – in particular the ecological, cognitive, affective, relational and economic dimensions. Rather than offering normative definitions or prescriptions, we seek to foster greater sensitivity to potential circularities, short-circuits, and contradictions of critical thinking, and to identify opportunities and openings for contextualized and responsible collective experiments toward other possibilities of (co) existence. Thus, we emphasize a pedagogical approach to decolonization that recognizes the role of the unconscious, complexity, complicity and uncertainties in this type of work.

Keywords: Decolonization; Pedagogy; Modernity; Colonialism.

Faz mais de 6 anos que Eve Tuck e K. Wayne Yang (2012) publicaram um texto importante que foi muito divulgado no Canadá, “Decolonização não é uma Metáfora”. O argumento de “que a linguagem da decolonização 7 foi adotada superficialmente no campo da Educação e de outras Ciências Sociais” (p.2) é muito relevante também em outros contextos onde o termo ganha popularidade. Muitos dos esforços recentes para transformar o sistema de ensino superior canadense, por exemplo, são articulados a partir da abordagem da decolonização. Outro exemplo é o Estado boliviano que incorporou a decolonização como um objetivo em suas leis educacionais. Existem atualmente conferências inteiras, além de livros e jornais académicos dedicados ao tema. O crescente interesse pela decolonização oferece numerosas oportunidades para o engajamento em análises estruturais e sistémicas e na criação de estratégias educacionais para imaginar e criar espaços para diferentes futuros decoloniais. No entanto, como apontam Tuck e Yang, existe uma ambivalência nesta crescente popularidade. Além da tendência de se reduzir decolonização a uma metáfora, o que sugere uma falsa promessa de transcender a colonização “sem abdicar de nada” (Jefferess,2012), nós percebemos também que decolonização tem sido frequentemente tratada como lugar e sujeito de consumo e acumulação nos quais pessoas buscam soluções dentro dos paradigmas existentes, dos desejos padronizados e das zonas comuns de conforto. Neste processo, hábitos de existência e padrões coloniais de relacionamento acabam sendo reproduzidos no exato momento em que poderiam ser perturbados. Como resultado desta circularidade crítica, muitas possibilidades decoloniais são prematuramente encerradas.

No contexto do trabalho do coletivo “Sinalizando rumo a futuros decoloniais” 8, já escrevemos extensamente tanto sobre o potencial generativo quanto sobre o potencial nocivo do engajamento com decolonização em contextos educacionais (Ahenakew, 2016; Ahenakew, Andreotti, Cooper & Hireme, 2015; Ahenakew & Naepi, 2015; Andreotti, 2016; Andreotti, Stein, Ahenakew, & Hunt, 2015; Andreotti, Stein, Sutherland, Pashby, Suša, Amsler, & the Gesturing Towards decolonial Futures Collective; Naepi, Stein, Ahenakew, & Andreotti, 2017; Stein & Andreotti, 2016, 2017; Stein, 2018; Stein, Hunt, Suša, & Andreotti, 2017). Em nossas pesquisas, no ensino e no engajamento comunitário com o tópico, estivemos menos preocupados em oferecer definições normativas sobre decolonização, ou em criar uma prescrição para planos de ação, e mais orientados para o desenvolvimento de sensibilidades a potenciais circularidades críticas e atalhos (o que chamamos de “radares decoloniais”), e para identificar oportunidades e aberturas a experimentos coletivos e contextuais que encenem diferentes formas de relacionamento e diferentes possibilidades de existência, sem oferecer qualquer tipo de garantia. Isto é, estes experimentos são levados adiante com um senso de humildade que reconhece que provavelmente iremos apenas apontar na direção da decolonização cometendo erros que por sua vez oferecem importantes oportunidades de aprendizagem. Esses aprendizados podem ser úteis para outros educadores com uma orientação decolonial em seu trabalho, e também para aqueles comprometidos em trabalhar com e através dos desconfortos, desafios e contradições inerentes a este tipo de prática pedagógica. Por isso, embasamos este artigo em nossos próprios esforços colaborativos para vislumbrar e apontar rumo a futuros decoloniais. Nesta proposta pedagógica, reconhecemos o papel do inconsciente, da complexidade, da cumplicidade e das incertezas, e utilizamos múltiplas interpretações e dimensões teóricas e práticas decoloniais – em particular, suas perspectivas ecológica, cognitiva, afetiva, relacional e económica.

Começamos este artigo revisando nossos trabalhos anteriores em língua portuguesa (Andreotti, Pereira, Edmundo, 2017; Andreotti, 2018; Andreotti, Stein, Susa, Coletivo, 2019) de mapeamento de teorias de mudanças sociais em relação a esforços existentes de decolonização, para ilustrar como o uso de “cartografias sociais” 9 cria possibilidades para uma abordagem pedagógica, ao invés de prescritiva, sobre decolonização. Após elaborarmos como a tendência consumista, dirigida por hábitos coloniais, apegos e vícios afetivos/cognitivos, pode se manifestar em quaisquer destas teorias, introduzimos uma metáfora – “a construção da casa da modernidade” (Andreotti, Stein, Susa, Coletivo, 2019) – a qual temos utilizado e desenvolvido em diferentes contextos para nos ajudar a compreender como as incertezas e instabilidades do presente oferecem precárias aberturas para um engajamento mais aprofundado com teorias decoloniais de mudanças e suas implicações, assim como com as dimensões afetivas da transformação. A seguir, contrastamos as potenciais circularidades dos desejos baseados no consumo com o anseio por tipos diferentes de conexões e formas de existência, e enfatizamos a importância de se dirigir a estes anseios enquanto permanecemos conscientes das sempre presentes armadilhas da reprodução dos hábitos de existência coloniais normalizados. Posteriormente, revisamos alguns dos aprendizados de nossos próprios esforços em se engajar com possíveis alteridades, introduzindo uma estrutura composta de cinco múltiplas dimensões de justiça global articuladas de forma integrada. Concluímos este artigo com perguntas para nos ajudar a analisar os vários desafios sociais, políticos e ecológicos a partir de uma perspectiva intelectual, somada a um conjunto de orientações afetivas que podem nos permitir compostar hábitos cognitivos/afetivos nocivos e reconstruir hábitos mais saudáveis de saber, de ser, de querer e de se relacionar.

Pensando Pedagogicamente com/por meio da Decolonização usando Cartografias Sociais

Todo o diagnóstico sobre o presente contém em si mesmo uma visão sobre um futuro preferível, implicitamente ou não. Juntos, um diagnóstico e sua proposição resultam em uma teoria de mudança. Enquanto é cada vez mais comum imaginar mudanças sociais através da lente da decolonização, existe uma considerável diversidade de análises precisamente sobre o que constitui colonização, e como podemos promover a decolonização. Ainda assim, propostas que possibilitem futuros decoloniais nem sempre seguem de forma lógica ao diagnóstico da colonização, particularmente em um contexto contemporâneo no qual a autoridade epistêmica é crescentemente descentralizada, condicionada por conflitos identitários, e frequentemente contraditória, e as opiniões individuais são forjadas mais por conveniência e leituras seletivas do que por modelos teóricos coerentes, orientações políticas ou valores imutáveis (Bauman, 2000). Ademais, notamos ainda uma lacuna significante entre intenções expressas e esforços reais de decolonização. Por reconhecer as lacunas comuns entre o dito e o feito, a natureza polarizante das conversas sobre colonialismo, e o risco de circularidades envolvido nos esforços para mudanças sociais, nossa estratégia para o engajamento com diferentes teorias decoloniais sobre mudança tem sido primordialmente pedagógica, ao invés de prescritiva. Isso é, ao invés de afirmar qualquer diagnóstico ou proposição particular como única abordagem ética ou viável para decolonização, nós buscamos convidar para um engajamento com uma gama de possibilidades, particularmente usando metodologias de cartografia social, nas quais abordagens contrastantes para um problema comum são mapeadas, e suas intenções políticas e filosóficas identificadas e desconstruídas, de modo a trazer luz a suas escolhas onto-epistemológicas (Andreotti et al., 2016 Paulston, 2000; Susa & Andreotti, 2019).

Em nossa experiência, cartografias sociais podem auxiliar pessoas a esclarecer as condições e particularidades de seus próprios contextos, aprendendo a ficar com as contradições sem tentar resolvê-las de imediato. Cartografias contribuem com a profundidade e o rigor de processos intelectuais orientando-os através de generosidade crítica, atenção a diferenças, contradições e auto-implicação, evitando assim soluções simplistas para problemas complexos. Ao mesmo tempo, as cartografias criam espaço para amplitude e integridade dos processos afetivos e relacionais envolvidos ao enfrentarmos os desafios atuais em todas suas dimensões, e para andarmos (e tropeçarmos) juntos em direção a outras possibilidades, sem tentar com isso determinar de antemão a forma de caminhar ou o destino desejado. Ademais, esses processos acontecem com respeito ao ritmo de aprendizagem de cada pessoa, ao mesmo tempo que mantém um senso de responsabilidade com aqueles afetados negativamente por estes ritmos e aprendizados, dadas a extensão e a urgência dos desafios enfrentados. Em última instância, a intenção é apoiar pessoas a criar e tomar responsabilidade por suas próprias decisões sobre como lidar com desafios dentro de seus próprios contextos.

Tudo isso se traduz em processos pedagógicos inter relacionados que podem ajudar a trabalhar com/através de posições divergentes sobre de/colonização, incluindo:

  • Identificar diferentes diagnósticos de colonização e proposições para decolonização a partir de cada diagnóstico (ex: diferentes teorias de mudança);
  • Rastrear as suposições, investimentos e histórias por trás das diferentes teorias decoloniais de mudança, desalojando investimentos e interpretações existentes, para questionar o que cada uma delas permite e interdita;
  • Pensar de forma (auto) reflexiva e sistêmica sobre nossas relações individuais e coletivas com estas suposições, investimentos e histórias para convidar a curiosidade, reflexividade, abertura e a expansão das sensibilidades;
  • Trabalhar com e através dos limites, tensões e contradições entre diferentes teorias de mudança, reconhecendo a parcialidade de cada uma delas;
  • Convidar (de forma responsável) experimentações com possibilidades decoloniais a partir de um lugar de humildade, consciência histórica, generosidade e auto-implicação.

Para ilustrar o uso destas cartografias, vamos agora revisar uma versão de uma das cartografias “raiz” que primeiro utilizamos no artigo “Mapeando Interpretações sobre Decolonização no Ensino Superior” (Andreotti et al., 2015) 10, a qual temos continuamente revisitado e revisado em resposta a mudanças de contexto e de audiência. Aqui, retornamos a essa cartografia com um foco renovado, com o qual podemos identificar e interromper padrões de decolonização orientados por desejos de consumo baseados em hábitos coloniais de existência, de modo a que possamos reorientar esforços decoloniais para o que entendemos como um anseio por conexão baseado em outras possibilidades de (co)existência.

Esta cartografia é organizada ao redor de diferentes abordagens sobre a modernidade, para assim ilustrar como cada espaço de reforma identificado vê a relação entre modernidade e colonização de forma diferente – e portanto, oferece uma visão distinta da decolonização. Antes de revisarmos este mapa de diferentes abordagens, faremos uma breve revisão do significado da modernidade e o nosso entendimento de suas partes constituintes – que descrevemos utilizando a metáfora da “construção da casa da modernidade” (Stein et al., 2017; Andreotti et al., 2019).

Figuras 1 e 2 – A construção da casa da modernidade e seus custos escondidos

As fundações desta “casa da modernidade” são construídas em uma base de concreto que separa humanos do resto da natureza, criando uma escala de valores que compara e ordena estes seres supostamente separados de acordo com sua utilidade percebida. Umas das paredes da casa é representadas por azulejos compostos de valores Humanistas ocidentais e tradições de saberes do Iluminismo, recheadas de promessas de consenso e relevância universais. Na outra parede, a sustentação é feita pelos Estados-nação, os quais prometem segurança através dos mecanismos de fronteira, direitos e homogeneidade nacional. Os azulejos do teto da casa são o capitalismo global, organizado em camadas contínuas de crescimento econômico e consumo como indicadores de progresso e civilização. Enquanto a construção da casa da modernidade oferece promessas reluzentes, essas promessas são subsidiadas por uma camada subterrânea colonial: os custos externalizados e invisíveis de construir e manter a casa. Isso inclui expropriações históricas e atuais, roubos de terras, explorações, destituições, fome e má nutrição preveníveis, aprisionamentos, desapropriações, epistemicídios, ecocídios e genocídios.

A relação de alguém com a casa e seus esforços (ou falta de) em acessar suas promessas dependerá em parte de onde a pessoa se situa em relação a ela tanto no momento presente quanto aspiracionalmente (ex: contentamento com a existência no porão, monopolizando espaços nos andares do topo; buscando mobilidade do primeiro piso para o topo; na porta lutando para entrar; fora da casa, mas sem tentar entrar). Nós vamos retornar a esta metáfora mais adiante, quando discutirmos o que ela pode nos dizer sobre como lidar com desafios contemporâneos. Primeiro, porém, introduzimos outra cartografia para nos ajudar a visualizar as implicações de diferentes relações com a modernidade, que se desdobram em três diferentes abordagens para mudanças sociais: reforma sútil, reforma radical e “além” da reforma.

Figura 3 – Diferentes interpretações para decolonização no ensino superior


As abordagens para a decolonização articuladas de dentro dos espaços de reforma sutil (Soft-reform space) focam em incluir populações tradicionalmente marginalizadas nas instituições existentes. Nestes espaços, a colonização é primeiramente diagnosticada como um problema de exclusão das benesses da sociedade moderna: a mobilidade social oferecida pelo capitalismo; a ordem e o pertencimento oferecido pelos Estados-nação; a Razão universal e os valores oferecidos pelo Humanismo ocidental e as tradições iluministas de conhecimento; a autonomia, a autoridade e o individualismo possessivo oferecidos pela separação dos humanos da Terra e uns dos outros. A teoria de mudança que orienta a reforma-sutil é uma de ajustes metodológicos – a ideia de que os sistemas e estruturas aos quais habitamos são adequados, mas a forma como nos engajamos com eles necessitam de constantes atualizações para garantir melhorias contínuas em eficiência e eficácia. Embora as diferenças não sejam inteiramente omitidas, a inclusão é condicionada a um consentimento quanto a um horizonte de esperança orientado por objetivos compartilhados e coerência ao redor de um suporte contínuo para as normas sociais, políticas e econômicas existentes. O ideal aqui é incorporar formas de diferença que não façam diferença, para que aqueles que estejam sendo incluídos possam ser suavemente absorvidos pelas instituições existentes. Nesta abordagem, possíveis alternativas para organizar relações e recursos que desafiam essas normas são deslegitimizadas ou consideradas ilegíveis, e assim a única proposição possível passa a ser expandir o acesso às instituições existentes.

Em contraste com o espaço de reforma sutil, o espaço de reforma radical (Radical-reform space) identifica a colonização como um produto de representações excludentes e redistribuição inadequada – o que se traduz em questões não apenas relacionadas sobre o que fazemos em instituições modernas (ex: preocupações metodológicas), mas também como pensamos e justificamos o que fazemos (ex: preocupações epistemológicas). O diagnóstico da colonização é orientado por análises sistêmicas que criticam relações desiguais de produção de conhecimento, que por sua vez racionalizam distribuições desiguais de recursos, trabalho e valor simbólico. Essas desigualdades são tidas como um subproduto das estruturas de dominação da modernidade, e por isso, nesta proposição a única correção possível se dá  através de uma reestruturação radical das relações sociais. Porém, críticas a partir deste espaço tendem a desarticular e priorizar uma ou às vezes duas dimensões do colonialismo (ex: despossessão capitalista, racismo, heteropatriarcado, capacitismo, imposição da democracia liberal no formato Estado-nação) ao invés de entender as interconexões entre estas dimensões. Neste espaço, o horizonte de esperança mira os mecanismos modernos que produzem desigualdades duradouras com o intuito fundamental de refazer a modernidade em si. Assim espera-se que a criação de mais espaço para diferentes saberes, pessoas e experiências, e a realocação de recursos para apoiar esta presença, levará à transformação de uma instituição/sistema, ao invés destes saberes, pessoas e experiências serem absorvidos por uma instituição/sistema que de outra forma permaneceria imutável. Estratégias propostas para a decolonização nestes espaços incluem empoderar, amplificar e centralizar a voz de sujeitos marginalizados (ex: representação substantiva que vá além de mero tokenismo) e redistribuir recursos.

A distinção entre os espaços radicais e além da reforma (Beyond-reform space) se dá no reconhecimento por esse de que a adição de outras formas de saber e a redistribuição de recursos não será suficiente para mudar as infraestruturas que sustentam o sistema moderno/colonial. O colonialismo aqui não é entendido apenas como a ocupação de territórios, subjugação de povos, distribuição desigual de recursos ou formas de saber excludentes, mas como condição necessária à própria existência da modernidade. Assim, o colonialismo é visto como lado obscuro constituinte da modernidade: inerentemente extrativista, antiético e insustentável, e portanto, impossível de ser reformado. A partir desta perspectiva, adicionar múltiplas epistemologias na mesma fundação ontológica (moderna) será sempre uma estratégia limitada para interromper hábitos coloniais de existência (Ahenakew, 2016; Ahenakew et al., 2014; Kuokkanen, 2008). Isso não significa que reformas imediatas para instituições modernas – incluindo estratégias de redistribuição e representação – não sejam importantes, mas sim que em última análise, estas instituições não podem ser reformadas ou redimidas se o objetivo for acabar com a colonização.

Teorias de mudança enraizadas no espaço além da reforma são variadas, mas geralmente se encaixam em uma de três alternativas, sendo que cada uma delas oferece possibilidades e limitações (e podem também ser usadas em conjunto): “saída”, “substituição”, “hackeamento”, ou “cuidados paliativos.” Aqueles que tentam “sair” do ou “substituir” o sistema moderno geralmente procuram alternativas aos sistemas e instituições modernas que ofereçam garantias. Isso pode incluir, por exemplo, esforços para desenvolver ou reaver epistemologias e/ou modos de organização social que foram ativamente reprimidos pela modernidade. Embora haja muito a aprender com este tipo de trabalho, alternativas comprometidas com uma garantia de desfecho desejada podem ainda estar enraizadas em ao menos algum dos desejos coloniais  (e.x. de certeza, progresso, inocência), e também podem ser romantizadas a um ponto no qual suas carências e inevitáveis erros e contradições sejam ignoradas. Ademais, a habilidade para optar por “sair” ou não do sistema precisa ser entendida em contraste com aqueles que não tem esta opção pois já estão de início estruturalmente excluídos do sistema e sujeitos a suas formas mais puras de violência – uma distinção que descrevemos como entre aqueles envolvidos em lutas de alta e baixa intensidade. Nenhuma delas é mais ou menos pertinente do que a outra – ambas são necessárias – mas a posição de alguém em relação a estas intensidades contrastantes deve informar o papel que cada um desempenha dentro de um projeto maior de decolonização.

Aqueles que se propõem a “hackear” as instituições modernas procuram redirecionar os recursos de dentro do sistema para nutrir outras possibilidades, sejam esforços educacionais para identificar os limites destas instituições, sejam suporte a sistemas alternativos (ou ambos). Esta abordagem pode ser entendida como uma abordagem “um pé dentro, um pé fora,” que necessita que um determinado alguém “jogue o jogo” da instituição enquanto tenta curvar as regras para outros fins além da “vitória”. Muitos bons trabalhos podem ser feitos por esta abordagem, mas é difícil perceber quando alguém está manipulando o sistema ou sendo manipulado por ele. Ademais, algumas pessoas operando neste espaço podem se posicionar do lado de fora das implicações do sistema de modo a focalizar em uma resistência individual e falhar em atender à cumplicidade estrutural no dano causados pelo sistema.

A última proposta além-da-reforma é a que nomeamos “cuidados paliativos”, que reconhece o inevitável fim das antiéticas e insustentáveis instituições da modernidade, mas vê a necessidade de propiciar uma “boa” morte, na qual importantes lições são aprendidas através dos erros do sistema convalescente, lições essas que podem ser aplicadas enquanto testemunhamos e ajudamos a parir o nascimento de algo diferente. Esta abordagem também requer que apliquemos cuidados paliativos aos nossos próprios investimentos nas promessas da modernidade, sem rejeitar reativamente a modernidade nem tentar controlar os termos de sua dissolução, o que pode paradoxalmente reproduzir muitos padrões coloniais de consumo, mas através de processos auto-implicados de enfrentamento de nossos próprios desejos e hábitos de existência coloniais. Na interface entre estas mortes e nascimentos está o imperativo de andar firmemente no “olho da tempestade” sem saber claramente para onde se está indo: mova-se muito rápido ou muito devagar, e poderá ser varrido e atirado no vórtice da mudança. Nós elaboramos mais sobre estes cuidados paliativos posteriormente no artigo.

Interrompendo as circularidades coloniais enquanto a “Casa da Modernidade” definha

Por mais que consideremos importante entender a significativa diferença entre estas teorias de mudança decoloniais – isto é, os diagnósticos de colonização e as propostas para decolonização – em todos esses anos trabalhando com esta cartografia, percebemos cada vez mais sua importância também para entender como estas teorias são mobilizadas e encenadas. Em particular, notamos que devido à forma como muitos de nós fomos socializados dentro dos hábitos de existência coloniais dos sistemas e instituições modernas, há uma necessidade de analisar não apenas as dimensões intelectuais da de/colonização, mas também suas dimensões afetivas e relacionais. Nós descobrimos que independentemente de onde alguém esteja localizado dentro do espectro “sutil-radical-além”, apenas articular ou se alinhar a uma crítica intelectual sobre a colonização não imuniza este alguém de reproduzir desejos e hábitos de existência modernos/coloniais. Identificamos estes padrões de forma recorrente tanto em contextos educacionais diversos como dentro de nós mesmos. Particularmente, observamos nossas próprias dificuldades em quebrar esses padrões, apesar das nossas sinceras intenções em imaginar e agir de forma diferente.

Esses hábitos e desejos podem ser pensados como viciantes, no sentido de que são difíceis de serem interrompidos mesmo quando sabemos de seu potencial nocivo (para os outros e para nós mesmos), uma vez que são de alguma forma aprazíveis, e/ou oferecem algum alívio, independentemente do quão temporários estes prazeres ou alívios podem ser e do dano que podem causar (Kapoor, 2014). É portanto não (apenas) a falta de informações que leva à reprodução do colonialismo, mas também os investimentos afetivos duradouros em suas promessas e prazeres. Por isso, sugerimos que qualquer pedagogia decolonial precisa endereçar, com crítica e compaixão, os apegos e direitos afetivos percebidos que formam as bases dos hábitos e vícios de existência coloniais, tanto nos outros como em nós mesmos – em particular, desejos comuns de:

  • Auto-transparência (através da presunção de que podemos ser completamente honestos conosco e com os outros sobre nossos desejos, intenções e investimentos);
  • Teleologia/progresso (através de movimentos lineares em direção a objetivos pré-definidos);
  • Afirmação (da bondade/valor/virtude/merecimento/excepcionalismo de alguém);
  • Inocência (através da desidentificação com a cumplicidade no dano);
  • Certeza (através de respostas claras e resultados garantidos);
  • Liderança/controle/autoridade canônica (sobre a direção e o caráter da mudança);
  • Consenso/coerência (como pré requisitos para relacionamentos e colaborações);
  • Individualismo/autonomia (em que a interdependência com e a responsabilidade para outros seres não é uma opção inerente – ex: baseada no livre arbítrio).

Quando esses desejos não são atendidos, podem surgir sentimentos de frustração, falta de esperança e traição, que por sua vez podem resultar em diversas demonstrações de  fragilidades e até de violência material. Pensando pedagogicamente, se estes desejos não são identificados, interrompidos e “compostados”, isto é, transformados em algo diferente e mais generativo, então a decolonização em si ou sofrerá uma resistência completa, ou será empacotada em processos, experiências ou expressões que podem ser prontamente consumidas de forma a apaziguar estes desejos e até produzir algum benefício a curto prazo, mas que farão pouco para interromper as nocivas estruturas subjacentes. Em outras palavras, enquanto o trabalho intelectual de traçar os contextos e histórias sociais, políticos e econômicos que moldaram o presente colonial são partes vitais de qualquer esforço de decolonização, apenas aprender sobre as relações coloniais de poder não interrompe os modelos dominantes de saber, ser, querer, desejar e ter esperanças que são continuamente refeitos através destas relações.

Apesar (ou talvez por causa) de nosso reconhecimento a estas circularidades e curto-circuitos, permanecemos comprometidos com estratégias de engajamento com os horizontes possíveis de decolonização, particularmente de forma a manter estas circularidades visíveis sem sugerir cinicamente sua inevitabilidade. Parte deste compromisso de longo prazo vem das observações nossas e de outros sobre o estado atual da “casa construída pela modernidade”. As formas dominantes de organização políticas, econômicas e ecológicas estão começando a atingir seus limites internos. Embora a vida para aqueles vivendo dentro da casa sempre tenha sido subsidiada pela exploração e expropriação daqueles vivendo fora da casa, no porão da casa, e também por um crescente número de pessoas dentro da casa, a estrutura da casa aparenta estar cada vez mais precária e instável: o cimento de sua fundação está rachando, o teto está com goteiras e um mofo originado no porão está subindo para os outros andares. Apesar da casa estar começando a tremer, cada vez mais pessoas formam filas à sua porta, uma vez que o impacto da casa no planeta na qual ela existe (e do qual extrai seus recursos, e para o qual despeja seu lixo tóxico) se torna mais e mais perturbador para aqueles vivendo do lado de fora (seja por opção ou forças de exclusão), muitos dos quais historicamente providenciaram involuntariamente o trabalho e os materiais para a construção e manutenção dela.  Como resultado, as promessas da casa de certeza, segurança e igualdade de oportunidades para competir a uma posição dentro da casa – ex: uma classe média global – parecem cada vez mais improváveis e insustentáveis. Enquanto muitos estão em negação quanto ao seu frágil estado, aqueles que notam as rachaduras têm uma gama de reações, que podem ser mapeadas em relação à abordagem sobre a modernidade, de/colonização e relativas teorias de mudança.

Figura 4 –  Danos estruturais na casa construída pela modernidade

 

Aqueles que não são críticos à modernidade e acham que seus direitos estão em risco de serem retirados podem procurar elevar as portas da casa construída pela modernidade, ou até ativamente expulsar quem parece retirar mais recursos do que contribuir – geralmente aqueles difamados por narrativas herdadas, sejam elas nacionalistas, raciais de superioridade/inferioridade e meritocráticas. Pessoas nesta posição de “não crítica” podem inclusive tentar intensificar as crises da casa em um esforço para criar pânico e exacerbar o medo, e posteriormente, instrumentalizar estas emoções para justificar políticas ainda mais draconianas. Desnecessário dizer que esta posição não só não tem interesse, mas em muitos casos é também abertamente hostil a decolonização. Para aqueles nos espaços de reforma sutil, embora considerem a necessidade de eventualmente remendar ou substituir algumas partes da casa, em última análise não é percebido por eles nenhuma ameaça para sua existência no longo prazo, nem concebida qualquer alternativa possível de refúgio para substituí-la. Já quem está nos espaços radicais de reforma  pode ver o presente como uma oportunidade de remodelar completamente a casa – adicionando painéis solares e expandindo-a para comportar mais gente, usando materiais “verdes”. Entretanto, eles tendem a continuar acreditando que a casa tem uma boa estrutura, que sua manutenção não depende da violência sistêmica e que a casa permanecerá de pé por muito tempo ainda. Finalmente, aqueles em um espaço além da reforma diagnosticam uma insustentabilidade intrínseca no longo prazo, e por isso veem a necessidade de se olhar para além dos horizontes de esperança e mudança orientados pelo Capitalismo global, pelos Estados-nação, pela Razão e Valores universais, pelo antropocentrismo/separação e pela mobilidade social enquanto propósito de vida.  Deste espaço, originam-se diferentes posições: a abordagem de “sair do sistema” propõe substituir a casa por um outro tipo de casa que possa oferecer o mesmo tipo de segurança oferecida pela casa anterior, usando um modelo revisado – isso é, uma casa diferente mas com garantias. As abordagens de hackear e oferecer cuidados paliativos podem considerar necessário experimentar com outros tipos de abrigo, inclusive modificando os propósitos dos recursos materiais da casa, enquanto ao mesmo tempo alargam as rachaduras da casa para convidar as pessoas a vislumbrarem essas outras possibilidades e se engajarem em medidas para a redução imediata de danos para os mais vulneráveis.

Dadas as potenciais circularidades e sobreposições que ocorrem em e entre os espaços de reforma sutil, radical e além da reforma, muitos de nossos esforços pedagógicos são devotados a criar oportunidades de aprendizagem através das quais as pessoas podem não apenas encontrar e se engajar com diferentes críticas intelectuais do colonialismo, mas também trabalhar através de seus investimentos duradouros em hábitos coloniais de existência e suas relações com a modernidade. Por exemplo, muitas pessoas em cada um destes espaços – independentemente de suas teorias de mudança preferidas – investem afetivamente em um processo de transformação linear e prescritivo. Raramente as pessoas estão interessadas em ficar com as dificuldades e confusões da decolonização (sem procurar receitas ou respostas fáceis), ou em aprender a trabalhar com e através de suas próprias cumplicidades (sem procurar inocência para não serem dirigidos pela culpa e pela busca da absolvição ou pureza). Em outras palavras, até quando começamos a perceber que há um problema com o sistema que herdamos, nossa crítica tende a buscar atalhos (Hunt, 2018). Ao invés de se comprometer com processos de longo prazo de digerir e compostar nossos medos, negações e vícios que alimentam o sistema, para assim aprender com erros repetidos e gerar o adubo que pode nutrir diferentes futuros, a crítica é canalizada em um processo imediatista de consumo que gratifica aqueles medos, negações e vícios. Em última instâncias, o consumo da crítica evita um aprofundamento da responsabilidade sobre a saúde e o bem-estar do metabolismo mais amplo, e assim fecha as portas para outras possibilidades de (co)existência.

Enquanto, por um lado, as incertezas do presente podem levar alguns a serem mais abertos a possibilidades alternativas e experimentarem o trabalho difícil e desconfortável de digerir e compostar, a ausência de pisos seguros pode também apenas reforçar o desejo para certos resultados a partir destas alternativas (e assim, consumir a crítica de forma a alimentar os investimentos e vícios coloniais). Por exemplo, em espaços de reforma sutil, as pessoas desejam “marcar a alternativa” da decolonização de maneira a permitir sentirem-se bem e passarem para as questões que percebem como mais importantes, urgentes e universais. Na reforma radical, por vezes existe um desejo problemático de posicionar-se como um líder virtuoso da transição, encobrindo a própria cumplicidade estrutural, apagando a dimensão coletiva do trabalho decolonial e falsamente presumindo um caminho claro de mudança racionalmente definido. E nos espaços além da reforma, o sentido de urgência ao redor da casa colapsando pode levar à tentativa de apressar o processo de compostar os elementos antigos, de derrubar a casa antes que ela esteja pronta a cair e de apressadamente construir alguma outra coisa, levando potencialmente a uma falha em aprender as lições necessárias, que consequentemente podem apenas ser repetidas na próxima forma de abrigo.

Nosso reconhecimento a estes padrões problemáticos de resposta à instabilidade da casa é temperado pelo reconhecimento de que uma crescente desilusão com as suas promessas cria uma importante abertura para transformações e para o desdobramento de outras possibilidades de existência, embora tenhamos consciência de que algumas alternativas à casa construída pela modernidade podem ser ainda mais danosas do que a própria casa. Em nossa abordagem pedagógica sobre decolonização, olhamos para estratégias que não apenas convidem para espaços de curiosidade, abertura e possibilidade, mas que também cultivem a humildade, o vigor e a auto-reflexividade necessários para trabalhar através dos desafios do presente sem repetir circularmente os mesmos erros. Nós trabalhamos com e através das desilusões das pessoas, gentilmente apontando que se as ofertas da casa são ilusões, então no longo prazo a perda destas ilusões pode não ser algo ruim, mesmo se o processo for doloroso no curto prazo. Como parte deste processo, apoiamos o desenvolvimento de literatura crítica que possibilite às pessoas tomarem distância de suas respostas imediatas (diagnósticos de colonização e propostas de decolonização) para traçar sobriamente as raízes de suas desilusões com a casa, analisar a casa em si, e considerar diferentes medidas de curto, médio e longo prazo. Mas também apontamos para a possibilidade de possibilidades viáveis e inéditas que são percebidas como impossíveis por quem só conhece os parâmetros de existência dentro da casa.

De fato, reconhecemos que a desilusão com a casa pode ser baseada não apenas em uma crescente sensação de que suas promessas foram quebradas (ou talvez eram falsas afinal), mas também no sentido de que mesmo quando suas promessas são cumpridas, há uma insatisfação com a violenta separação forçada presumida e (re)produzida pela modernidade. Como Alexander (2005) argumenta, nosso sentido visceral de interdependência foi mutilado pelo colonialismo. Voltando à metáfora da casa “construída pela modernidade”, a fundação da separação entre humanos e a “natureza”, e entre os seres humanos, causou essa sensação de rompimento da interdependência. Enquanto muitos entorpecem a si/nós mesmos para a dor resultante, Alexander afirma que o desmembramento e a fragmentação material e psíquica criados pelo colonialismo também produzem um “anseio por completude, constantemente expresso como um anseio por pertencer, anseio que é tanto material quanto existencial, tanto psíquico quanto físico, e que, quando satisfeito, pode subverter e até desalojar a dor do desmembramento” (p.281). Para Alexander, a fonte deste anseio é um “conhecimento profundo de nossa interdependência – nem separados, nem autônomos” (p.282). Embora a organização social moderna negue este entrelaçamento, ou esta “diferença sem separabilidade” (Silva, 2016), a atual era de incertezas oferece aberturas pelas quais é possível convidar pessoas que estão se sentindo desiludidas a considerar quais infraestruturas e padrões de existência operacionalizam esta sensação de separação, e assim traçar seus efeitos violentos e se encontrar com a possibilidade de organizar e orientar nossa existência de outra maneira, com o fato de que “outras possibilidades” são viáveis. Este trabalho é ainda mais urgente dado que muitas respostas para os desafios atuais buscam vigorosamente reproduzir as ilusões de separação para protegerem direitos percebidos. Porém é importante enfatizar a lição contida no dizer brasileiro de que em uma situação de enchente, só podemos começar a nadar quando a água chega no quadril: as possibilidades de decolonização viáveis exigem que o contexto colonial torne-se existencialmente ou politicamente inviável. Até lá a preparação pedagógica é um passo importante para lembrarmos (não só conceitualmente, mas corporalmente) que é possível nadar.

Portanto, ao invés de transmitir conhecimento e informações relativos ao que os estudantes devem ou não desejar, procuramos chamar atenção para como os desejos são geralmente alçados e alocados dentro da modernidade pelas economias intelectuais, afetivas e materiais de produção de valor. A intenção pedagógica é convidar educadores e educandos a considerar: Como nossa educação nos aprisionou em conceitualizações de (e relações com) linguagem, conhecimento, agência, autonomia, identidade, crítica, arte, sexualidade, terra, tempo, espaço, e ego… que moldam e restringem nossos horizontes e o que consideramos possível/inteligível/imaginável? O que restringe o que é possível sentir, entender, articular, querer e imaginar? Conforme notado em nossa discussão sobre cartografias sociais, este trabalho pedagógico não é politicamente prescritivo – ele não articula nem advoga por uma única teoria de mudança seja diagnóstico ou proposição (apesar de estar enraizado no diagnóstico de colonialidade enquanto separabilidade) – mas sim convida para o engajamento com múltiplas teorias diferentes a partir da profundidade e do rigor do engajamento intelectual, da amplitude e da integridade do próprio processo de aprendizagem, incluindo suas dimensões não-intelectuais (especialmente relacionais e afetivas).

Embora convidemos estudantes a distinguir entre os (frequentemente tóxicos) desejos alocados pela modernidade e o anseio sobre o qual fala Alexander, não podemos buscar coagir os estudantes a “rearranjar seus desejos” (Spivak, 2004) para uma direção em particular ou um resultado pré-determinado. Dito isso, também reconhecemos a importância de uma experimentação responsável com outras possibilidades de existência para fora da casa construída pela modernidade, que é o trabalho com o qual nos engajamentos em nossos papéis como pesquisadores. Nós discutimos isso na parte seguinte do artigo.

Aprender com Experimentos para Além do Horizonte da Casa

Sob o título de “Sinalizando Rumo a Futuros Decoloniais”, trabalhamos em colaboração com outros pesquisadores, educadores, artistas e ativistas para investigar as seguintes questões: Como podemos aprender a tocar outras possibilidades de (co)existência viáveis mas ininteligíveis ou aparentemente impossíveis dentro dos paradigmas dominantes?  Que processos educacionais podem ultrapassar nossos hábitos sociais e respostas bioquímicas (medos, ansiedades, interesse próprio, narrativas, egos, tendências narcisistas, feridas, etc.), para ativar um senso de entrelaçamento visceral, responsabilidade, compaixão, humildade, generosidade e sobriedade (não dependentes da vontade ou da escolha intelectual), e abrir possibilidades/mundos viáveis, mas inimagináveis ou inarticuláveis dentro dos nossos sistemas de referência atuais? O que, para além de valores ou convicções compartilhadas, pode oferecer um antídoto à indiferença e gerar um senso de cuidado, conexão e compromisso com o todo?

Em um esforço para explorar possíveis respostas a estas questões, temos trabalhado com uma rede de iniciativas comunitárias sociais, ecológicas e educacionais, a maioria delas baseada na América Latina, cujos horizontes de esperança são orientados para além do capitalismo global, dos estados-nação, da razão/valores universais do ocidente e da separação (Andreotti et al., 2018). O diagnóstico destas iniciativas é de que a casa construída pela modernidade está entrando em colapso, e portanto nós precisamos gerar/regenerar modos de existência não determinados pelas quatro paredes da casa. Em nossos esforços de engajamento com estas iniciativas, reconhecemos a necessidade de não apenas aprender com os erros da casa, mas também de aprender com esforços duradouros e emergentes de vida fora da casa sem assumir que qualquer destes esforços terá alguma resposta universal. Nenhuma iniciativa isoladamente terá a “receita” certa de como podemos oferecer cuidados paliativos para a casa, ou como viver de forma diferente, mas elas têm muito a ensinar aos de dentro da casa por meio tanto de seus sucessos quanto de seus fracassos. Portanto, olhamos para essas iniciativas como “exemplos” em contextos específicos que podem oferecer importantes conhecimentos sobre os limites da casa e as dificuldades e contradições envolvidas em viver fora da casa, ao invés de “modelos” universais que deveriam ser duplicados e exportados para algum outro lugar.  Este trabalho é diferente mas informa nossas estratégias pedagógicas. Ele se diferencia notadamente no sentido de que nesta pesquisa estamo-nos engajando em profundidade com uma posição normativa particular, mesmo fazendo-o de forma não normativa. Esta posição é a de que a casa se construiu a partir da separabilidade, de que de fato está desmoronando, e que precisamos expandir nossas disposições intelectuais, afetivas e relacionais para “cavar mais fundo” (para análises com mais nuances) e “relacionar mais amplo” (alargar as sensibilidades e formas de relacionamento de que somos capazes).

Neste trabalho, buscamos desenvolver “uma forma alternativa de engajamento com alternativas” (Santos, 2007), isso é, engajar com reverência mas sem romantizar ou idealizar, assumindo responsabilidade pelas relações que estamos construindo sem projetar nossos desejos em outros e atentos aos desafios de se relacionar através de outras sensibilidades. Particularmente, reconhecemos os riscos de: homogeneizar comunidades diversas, ocultando suas complexidades e relações internas de poder; idealizar formas de ser e saber “alternativas” e as comunidades que as praticam, como um espelho antagônico das patologias coloniais; promover fantasias escapistas que nos permitiriam imergir em outros tipos de abrigo para evitar realizar os cuidados paliativos necessários à casa que herdamos; e distorcer e/ou instrumentalizar estas iniciativas a fim de alimentar nossos próprios desejos coloniais de consumo (Asher & Wainwright, 2018; Spivak, 1988). Portanto, perguntamos: Como podemos nos engajar e ser ensinados por sistemas diferentes de ser, saber e desejar, e por lutas práticas e tentativas de criar/regenerar alternativas para a casa construída pela modernidade, permanecendo conscientes de dádivas, limitações e contradições, assim como de nossas potenciais más interpretações, projeções e apropriações?

Como parte desta pesquisa, construímos estudos de caso colaborativos de diferentes iniciativas e organizações, mas para discussões entre nós e com nossos colaboradores, e considerando o que será mais útil para o aprendizado de nossos estudantes e outros esforçando-se para fazer sentido de uma casa desmoronando.  Os resultados primários de pesquisa deste trabalho não são relatórios de nossas “descobertas” empíricas, mas sim modelos pedagógicos continuamente revisados, experimentos artísticos e cartografias sociais. Uma destas é o Marco de Justiça Global “Aos Cuidados da Terra” (Andreotti, Stein, Rene, coletivo, 2019), uma cartografia que integra as dimensões ecológica, cognitiva, afetiva e relacional de transformação, que são frequentemente abordadas isoladamente ou em pares. Particularmente, usamos a metáfora do cogumelo, representando as dimensões ecológicas e econômicas da transformação, e embaixo delas, o micélio das dimensões cognitiva, afetiva e relacionais, responsáveis por alimentar o cogumelo e permitir a ele viver e, na hora certa, morrer também.

Figura 5 – Modelo de Justiça Global “Aos Cuidados da Terra

A intenção com essa metáfora é ilustrar a necessidade de se digerir e compostar as dimensões (micélio) muitas vezes invisibilizadas que alimentam um sistema nocivo, para algo diferente poder crescer. Carmen Ramos, da organização Nahuatl Tlalij, parte da rede “Aos Cuidados da Terra”, nos instigou a levar esta cartografia ainda mais longe, focando no trabalho invisibilizado da Terra em sustentar toda a vida, e em considerarmos nossas responsabilidades particulares com ela e uns com os outros como seres entrelaçados em seu metabolismo mais amplo. Particularmente, ela esclarece que nós não (apenas) buscamos cuidar da Terra, mas estamos já e sempre aos cuidados dela. Ao fazer isso, Ramos também solicita levarmos em conta que enquanto há uma tendência (alimentada por hábitos coloniais de ser) em prescrever uma normatividade política para ordenar nossas relações, é na verdade a qualidade de nossas relações (com todos os seres) que determina as possibilidades políticas viáveis em qualquer contexto. A partir desta perspectiva, ao invés de gastar nosso tempo discutindo a melhor articulação possível de nossas posições políticas, dentro do mesmo limitado conjunto de configurações cognitivas, afetivas e relacionais, nós precisaríamos começar a expandir e nutrir diferentes tipos de configurações para abrir possibilidades para tipos de políticas que poderiam oferecer suporte a integridade de nossos relacionamentos e às responsabilidades oriundas deles. Desnecessário dizer, esta abordagem é significativamente diferente das políticas geralmente apoiadas pela casa que são baseadas na onto-metafísica onde nossa existências (ser) é determinada pelo nosso pensamento, e portanto, nossos comportamentos pelas nossas convicções.

Conclusões Inquietantes e Questões para Continuar essa Conversa

Neste artigo, discutimos algumas das potenciais circularidades, curto-circuitos, e contradições que emergem dos esforços de colocar em prática a decolonização, inclusive aquelas que reproduzem hábitos coloniais de ser enraizados nos desejos de consumo cultivados pela casa construída pela modernidade. Nós também sugerimos que nenhuma das várias possibilidades existentes de teorias de mudança decoloniais estão imune a estes riscos, uma vez que são em larga medida produto não de nenhuma análise conceitual em particular mas de investimentos afetivos cultivados através de hábitos coloniais de ser socializados dentro da casa construída pela modernidade. Neste sentido, contradições e circularidades são de alguma forma inevitáveis, o que significa que existe uma necessidade de nossas pedagogias anteciparem e serem sensíveis a estas respostas de maneira a problematizar mas também convidar as pessoas a trabalharem através delas (ao invés de negar, transcender ou reprimir). Este trabalho pode ser sumarizado como um compromisso pedagógico de convidar a um engajamento mais profundo com as complexidades e contradições de diferentes teorias de mudança relacionadas com padrões de saber, ser, relacionar e desejar alimentados pela casa sem com isso advogar por nenhuma teoria em particular como “a resposta” para o que devemos fazer. Isto é, convidamos as pessoas a cavarem mais fundo e relacionarem mais amplamente.

Para além deste trabalho intelectual e relacional, nós também elaboramos sobre as precárias possibilidades que se abrem quando um sentido visceral de anseio por interconexões é ativado ou des-entorpecido. Quando os trabalhos afetivo, intelectual e relacional são combinados, e quando estes são envolvidos em um contexto de crescente desilusão com as promessas oferecidas pela casa construída pela modernidade, existem muitas possibilidades precárias para um aprendizado transformador. Nós revisamos algumas de nossas próprias práticas para se engajar e aprender com esforços para viver fora da casa através de uma rede de iniciativas sócio-ecológicas, pesquisa esta distinta, mas que ainda assim informa nosso trabalho pedagógico. Esse trabalho nos ensinou que, como educadores, podemos pedir ou até mesmo exigir que as pessoas se engajem com rigor intelectual, mas podemos apenas oferecer um convite para o engajamento com outras possibilidades de existência se os estudantes sentirem o chamado para tal. Isso acontece porque ao invés de uma questão de vontade ou intelecto, este trabalho precisa de uma certa quantidade de entrega existencial: aprender a desaprender, a escutar, a estar desarmado, a de-centralizar (as forças egóicas), a começar a praticar alteridade, sabendo que será desconfortável e que erros serão cometidos. Apenas se estivermos prontos a retirar nossos investimentos das estruturas de ser e desejar (não apenas de saber) sustentadas pelas economias que dependem e reproduzem as (falsas/quebradas) promessas da casa  é que poderemos começar a nos abrir a outras possibilidades. Este desinvestimento não é relacionado a uma busca por soluções articuladas para as crises que enfrentamos, mas sim  a percepção de que para existirmos de outra forma, precisamos prestar atenção nas lições ensinadas pelos limites, falhas e eventual colapso da casa a que habitamos. Isto só podemos fazer enfrentando a sua morte interna e externamente, abrindo-nos para a possibilidade de a casa não mais definir nossa existência ou atender nossos desejos e investimentos.

No contexto da escrita acadêmica de dentro da casa construída pela modernidade, encorajamos que os propósitos sejam claros, inclusive no contexto de bolsas de estudo. A demanda por conclusões é por vezes problemática, dada nossa tendência de ver o trabalho de decolonização como um trabalho em processo, inconcluso e que desafia resumos rápidos. Assim, já tendo oferecido alguns modelos para pesquisa e envolvimento pedagógico ao longo deste artigo, vamos concluir com convites para um envolvimento mais profundo.

Notamos cada vez mais pessoas desiludidas com a casa construída pela modernidade, e esta desilusão leva a muitas respostas possíveis, da renovação à demolição. Para aqueles desiludidos não apenas com a casa, mas também com as circularidades das respostas às crises atuais, oferecemos uma série de perguntas abertas para fazer sentido do presente e examinar opções potenciais para seguirmos em frente. Como sempre, não oferecemos soluções pré-fabricadas para as crises que enfrentamos, mas somos conscientes do imperativo de responder rapidamente a elas, de forma a mitigar as vulnerabilidades imediatas daqueles expostos às maiores violências perpetuadas pela casa, ao mesmo tempo em que consideramos um horizonte de transformação de longo prazo enquanto a casa desmorona. Assim, encorajamos as pessoas a refletir sobre as seguintes questões a respeito dos desafios atuais:

  1. Como o que aconteceu no passado se relaciona e informa o que acontece no presente? Especificamente, que lições nós ainda temos que aprender sobre o passado que podem ser úteis para entendermos os desafios que enfrentamos no presente?
  2. Com o que aconteceu no passado é diferente do que está acontecendo no presente? Especificamente, como precisaremos repensar nossas estratégias herdadas tanto para análises conceituais (diagnósticos) como resposta práticas (proposições)?
  3. O que podemos aprender suspendendo nossos desejos por soluções universais ou prescritivas e por autoridades canônicas estáveis, prestando atenção de maneira sóbria ao que está funcionando atualmente, e o que não está, e baseado nesta análise, determinar quais respostas são necessárias no curto, médio e longo prazo? Como podemos fazer este trabalho de responder aos desafios enquanto mantemos um compromisso contínuo de avaliar estes planos constantemente ao invés de permanecermos apegados a uma ortodoxia que não está funcionando?

Estas questões miram primeiramente a dimensão intelectual do desafio de viver de outra forma, mas este trabalho será incompleto se não for combinado com esforços para reconfigurar nossas relações afetivas e oferecer cuidados paliativos para nossos próprios hábitos coloniais. Assim, concluímos com a seguinte pergunta: Como podemos mobilizar “formas alternativas de se engajar com as alternativas” isso é, falando/dançando/respirando/tropeçando juntos de forma diferente em direção a um futuro indefinido, sem arrogância, autoritarismo, dogmatismo e perfeccionismo? Como resposta provisória a esta questão, sugerimos as seguintes práticas orientadoras:

  • Desinvestimento (da casa) sem aversão baseada em desidentificação reativa e redentora.
  • Reverência (para as dádivas das alternativas) sem idealizar ou romantizar.
  • Experimentação (necessária para o aprendizado) sem apego aos resultados obtidos.
  • Responsabilidade (para com todos os seres) sem paternalismo, ou projetando nossos desejos e entendimentos sobre os outros como se fossem universais.
  • Auto-implicação (nos danos) sem buscar imunidade, absolvição, ou escapismo.

 


[1] Universidade de British Columbia

[2] Terra Adentro

[3] Comunidade Indígena Patacho

[4] Comunidade Indígena Pitaguary

[5] Comunidade Indígena Huni Kui

[6] Musagetes

[7] O termo decolonização é empregado aqui como a imposição da separabilidade entre o dito homem e a dita natureza e a interrupção do sentido de continuidade entre corpo, terra e cosmos para além do tempo linear. Isso é diferente da des-colonização, que é normalmente entendida como a superação da dominação territorial e/ou administrativa sobre um determinado território  ou povo. Ao trazer o conceito decolonização, falamos também de uma série de hábitos de ser, desejar e consumir próprios da modernidade que são inerentemente violentos e insustentáveis.

[8] Título em inglês: Gesturing towards decolonial futures. Saber mais em decolonialfutures.net.

[9] Utilizamos cartografias sociais como ferramentas pedagógicas não normativas, que através de imagens (metáforas e analogias) e tabelas comparativas, convidam ao engajamento crítico com os múltiplos desafios sócio-ambientais que enfrentamos. Essas ferramentas nos ajudam a visualizar configurações históricas e sistêmicas dos problemas que analisamos, e a tornar visíveis aspectos frequentemente invisibilizados e conexões convenientemente escondidas. A proposta do uso destas cartografias não é sobre descrever a realidade precisamente, mas sim sobre mover conversas para além dos pontos em que são tradicionalmente interditadas.

[10] “Mapping interpretations of decolonization in the context of higher education”.

 

 

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