Rui da Silva1

Antoni Verger, Mario Novelli e Hulya Kosar Altinyelken (Org.) (2012) Global Education Policy and International Development: New Agendas, Issues, and Policies. London: Bloomsbury Academic

O livro “Global Education Policy and International Development: New Agendas, Issues, and Policies” explora o fenómeno designado GEPs – Global Education Policies. Este livro foi organizado por Antoni Verger, Mario Novelli e Hulya Kosar Altinyelken e editado pela Bloomsbury Academic em 2012.

Estamos perante um livro cujo conteúdo, potencialmente, interessa a investigadores e/ ou a ativistas e técnicos de educação.

O fenómeno das GEPs decorre do facto de várias organizações não-governamentais, agências governamentais e não-governamentais, fundações, entre outros (e.g. Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, União Europeia, Organização Internacional do Trabalho, UNESCO, UNICEF, Banco Mundial), com diversas tipologias e mandatos, veicularem em muitas partes do mundo um conjunto de políticas educativas similares, em locais muito diversos em termos culturais e de desenvolvimento económico. Os países do Sul global neste contexto de GEPs sofrem uma intensidade de influências globais superior, pois há um grande espaço – material e ideológico – para os agentes externos definirem as agendas e as prioridades educativas destes países.

Como fica evidente no parágrafo anterior, quando se fala em GEPs não estamos a falar de Educação Global enquanto conceito. Contudo, no quadro da educação para a cidadania global este livro oferece uma perspetiva crítica e informada de como as GEPs contribuem como pressão para um modelo de educação convergente a nível global.

O livro está dividido em três partes e a sua análise oferece um debate teórico e metodológico bastante rico incidindo nas razões pelas quais os decisores políticos nos países do Sul global adotam as GEPs.

A primeira parte do livro fornece um debate teórico e metodológico interessante sobre as GEPs. Contudo, os leitores mais interessados em questões de ordem prática podem passar diretamente para os estudos de caso presentes na segunda parte do livro, sem contudo deixarem de compreender o campo em análise.

No primeiro capítulo, os autores realizam uma problematização dos conceitos proporcionando um enquadramento das GEPs. No segundo capítulo, a autora aborda as questões metodológicas inerentes à investigação das GEPs desenvolvendo uma reflexão que evita os “cul-de-sacs” que muitas vezes estão inerentes à análise deste fenómeno.

A segunda parte do livro inclui dez capítulos (3-12). Esta parte permite aos leitores imergirem em estudos de caso de cariz empírico sobre os GEPs em países como, por exemplo, Turquia, Índia, África do Sul, Zimbabué, Uganda, El Salvador, Nicarágua e de organizações como, por exemplo, o Banco Mundial, a USAID e a Cooperação Holandesa.

A terceira e última parte inclui dois capítulos (13 e 14) de conclusão da obra e estão redigidos no formato de comentário ao seu conteúdo. No capítulo 13, a autora reflete sobre os processos de recontextualização e conclui referindo que não interessa apenas descrever as GEPs mas sim percebê-las, pois “it is the re-contextualization versions of one and the same global education policy that tell us something about context but also about the policy process and change” (p. 277). No que concerne ao último capítulo do livro, o autor faz uma retrospetiva global ao conteúdo do livro concluindo que “The volume itself underpins and illustrates the sense that ‘global’ talk entails recognition that involves not just a quantitative increase in the diffusion of similar policies, but fundamental reappraisals of what is meant by ‘global’ ‘education’ and ‘policy’” (p. 286)

Com a agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, principalmente com a inclusão no objetivo 4 sobre questões relacionadas com a cidadania global (meta 4.7), a temática e a reflexão crítica presente no livro ganham mais atualidade para os atores desta área. Este facto está relacionado com o que pode estar implícito na implementação desta meta 4.7, pois corremos o risco que a criação de um cidadão global passe apenas por uma visão hegemónica, impondo uma gramática universal de cidadania global, similar ao que é referido por Boaventura de Sousa Santos quando este autor reflete sobre o conceito de direitos humanos (Santos, 2013). Este risco é ainda ampliado pelo reaparecimento da ênfase da medição dos conhecimentos dos alunos e da implementação de testes internacionais que comparam países e regiões, e pela criação de rankings. Estes rankings e comparações requerem testes estandardizados e consequentemente perguntas estandardizadas, que pressupõem que todos os currículos são iguais, que todos os contextos são iguais e que todos os alunos aprendem ao mesmo ritmo. Como estes pressupostos não estão reunidos, procura-se uma definição de uma agenda global para a educação, apesar de haver indícios de que existe mais do que uma forma de estruturar o currículo para atingir melhores resultados e uma educação crítica e transformadora (Anderson-Levitt, 2008; Pacheco, 2011, 2014).

No âmbito da cidadania global o teste comparativo International Civic and Citizenship Study (ICCS) da Inter­national Association for the Evaluation of Educational Achievement, pode ganhar centralidade, com o risco que se corre quando os resultados deste tipo de testes são utilizados de forma simplista e descontextualizada para justificar opções políticas ou influenciar a opinião pública, por exemplo. Este facto acontece, pois na maioria dos países os exames estão muito associados a uma perspetiva sumativa da avaliação e não formativa e/ ou formadora.

Parece-nos que como estamos num processo de globalização também estamos num processo de conversação internacional, por exemplo, entre professores, alunos e pais (Pacheco, 2009) e esta pode ser uma oportunidade para que floresçam entre os mecanismos hegemónicos processos assentes nos pressupostos da ecologia dos saberes, pois esta “capacitando-nos para uma visão mais abrangente daquilo que conhecemos, bem como do que desconhecemos, e também nos previne que aquilo que não sabemos é ignorância nossa, não ignorância em geral.” (Santos, 2010, p. 56).

 


[1] Investigador do Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto.

 

 

Referências Bibiograficas

  • Anderson-Levitt, K. M. (2008). Globalization and Curriculum. In F. M. Connelly, M. F. He, & J. Philion (Eds.), The SAGE Handbook of Curriculum and Instruction (pp. 349-368). Londres: SAGE Publications.
  • Pacheco, J. A. (2009). Whole, bright, deep with understanding: life story and politics of curriculum studies: in-between William Pinar and Ivor Goodson. Rotterdam: Sense Publishers.
  • Pacheco, J. A. (2011). Discursos e lugares das competências em contextos de educação e formação. Porto: Porto Editora.
  • Pacheco, J. A. (2014). Educação, Formação e Conhecimento. Porto: Porto Editora.
  • Santos, B. S. (2010). Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia de saberes. In B. S. Santos & M. P. Meneses (Eds.), Epistemologias do Sul (pp. 23-71). Coimbra: Edições Almedina.
  • Santos, B.S. (2013). Se Deus Fosse um Activista dos Direitos Humanos. Coimbra: Edições Almedina.

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