- Título da dissertação: O Design como a expressão de fazer as coisas juntos — Um entendimento ecológico
- Autoria: Denis Kern Hickel
- Natureza do Estudo: Tese de Doutoramento
- Instituição: Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa
- Ano: 2014
- Disponível em: através do endereço deniskernhickel@gmail.com
Resumo
Esta tese é um trabalho de investigação em primeira pessoa que propõe um entendimento do design a partir de uma perspetiva ecológica, onde este é proposto como a expressão de fazer as coisas juntos. Neste contexto é também proposto um novo lugar da sua atividade, deslocando-o do foco sobre a materialização dos objetos da nossa cultura para a facilitação de processos criativos, que se constituem como plataformas de cocriação interativa, onde o processo de cocriar e as suas dinâmicas são o propósito, e onde o designer é um participante interativo.
Como forma de reflexão e aprofundamento sobre o entendimento teórico proposto, durante o processo da investigação foi desenvolvida uma atividade prática com a comunidade escolar do conselho de Torres Novas, que foi convidada a idear as suas escolas a partir de um cenário de futuro e de certos valores ecológicos, para criar o que se convencionou chamar um imaginário ecológico para as escolas de Torres Novas. Esta experiência vivida e o envolvimento com as escolas e seus resultados podem ser caracterizados como uma forma de ativismo através do design, onde o designer cumpre o papel de mediador social ao ativar, integrar e facilitar determinados domínios de relacionamento cocriativo, democráticos e inclusivos que, no entendimento deste trabalho, são essenciais para a construção de uma cultura de sustentabilidade ecológica.
Do ponto de vista metodológico, esta foi uma investigação orientada pelo design, ou seja, que trabalhou com as características exploratórias e generativas dos seus processos criativos e que vai buscar, em territórios além dos domínios teóricos do design, referências para poder contextualizar e propor um entendimento ecológico, um contexto diferente de prática, habilidades e ferramentas que os designers possam vir a desenvolver para cocriar alternativas para as demandas emergentes deste século. A experiência ativada com as escolas e as ideias geradas são sugeridas como valiosas para futuras inflexões dos designers nestes territórios de pratica.
A tese suporta que para promover uma sustentabilidade ecológica, incluindo aí a prática do design, é necessário tornarmo-nos ecoliteratos, ou seja, conhecer as dinâmicas dos ecossistemas e viver de acordo. O conceito de ecologia proposto pela tese não se configura como mais um problema com o qual temos para lidar, mas procura sim, estabelecer um entendimento da mesma como a nossa participação ativa e consciente nos processos que sustentam a vida no planeta e que portanto são inerentes ao nosso viver e fazer as coisas juntos. E a sustentabilidade ecológica, por fim, significa a construção coletiva de uma nova estabilidade cultural de acordo com estas dinâmicas. Tal processo implicará uma transmutação das explicações vigentes sobre bem estar e nos arranjos estruturais que caracterizam a cultura ocidental de crescimento material e que deverão culminar não em uma nova narrativa dominante, mas sim em muitas narrativas coexistentes. Neste sentido a tese encoraja que designers — como qualquer outra pessoa, individual, ou coletivamente — construa a possibilidade para experienciar determinados processos sociais e ecológicos como forma de construir suas próprias ecoliteracias.
Neste sentido, e a semelhança da experiência vivida durante a investigação, foram propostos três passos-guia para facilitar este processo: 1. Construir um entendimento holístico sobre as causas e extensão das questões sócio-ecológicas emergentes e situá-las dentro do escopo de entendimento das pessoas. 2. Ao mesmo tempo, situar as pessoas, as comunidades e o fazer humano dentro de uma perspectiva essencialmente ecológica que seja capaz de lidar com os desafios sócio-ecológicos deste século — a construção da ecoliteracia portanto. 3. Assim, munidos de tal entendimento, os designers, juntamente com outros indivíduos detentores de conhecimento e habilidades diversas — do mundano ao exotérico — poderão cocriar imaginários ecológicos como forma de antecipação, seguida de engendramento, articulação e empreendimento de ethos e habitats viáveis e desejáveis. Por exemplo, temas como alterações climáticas, ou o pico do petróleo, ou os impactos das nossas escolhas alimentares num mundo globalizado, estão fora daquilo que podemos experienciar e, portanto, longe do nosso escopo de entendimento. Reverter isso através de processos cocriativos para fundar novos contextos de aprendizagem, redes de consumo consciente, cooperativas de energia limpa, ou redes alimentares locais são apenas alguns elementos que ilustram as possibilidades do papel que se propõe para os designers do século XXI.
Portanto, a reflexão sobre os temas abordados por este trabalho e suas indicações são também habilidades passíveis de serem introduzidas nos domínios da educação dos designers. Finalmente, por ter vivenciado uma experiencia dentro de escolas e por ter facilitado um processo gerador de ideias para transformar a prática escolar, a partir das necessidades da sua comunidade, este trabalho também avança para sugerir que a educação, como a entendemos hoje, deveria transformar-se profundamente. Por ser produto e, ao mesmo tempo, parte estruturante do universo de pensamento e ação de uma civilização, que hoje, legitima a degradação ambiental em curso, a escolarização em massa deveria ser substituída pela facilitação de comunidades de aprendizagem livre. Onde, ao invés de uma estrutura hierárquica orientada por interesses e valores de terceiros, fosse então reestruturada para atender as necessidades reais das pessoas e seus lugares.
É neste contexto que os designers podem também participar, não como especialistas em educação, mas sim como especialistas em ativação de domínios comuns de cocriatividade. Afinal, explorar futuros desejáveis e potencialmente viáveis marca a essência do processo criativo do design — o design thinking. E o design — o plano, ou ato em direção ao futuro — é a expressão natural do nosso fazer as coisas juntos. Assim, qualquer design alinhado com as dinâmicas dos ecossistemas só pode surgir de uma revisão profunda do sistema de valores antropocêntricos, bem como — no campo da ecologia das relações humanas — das intenções, e aspirações, emoções e atitudes que permeiam os seus processos criativos.
Palavras-chave: Design Participativo; Pensamento Ecológico; Cenários de futuro; Educação; Investigação na ação.
Abstract
This research is a situation of design within an essentially ecological perspective. This is supported by a theoretical framework and an ideation process designed to be held with some of the schools of the Municipality of Torres Novas, Portugal, where the students were invited to imagine their school in relation to a future scenario and certain ecological values and concepts to co-create what was called an Ecological Imagination for the Schools of Torres Novas. This lived experience made possible a reflection about a different domain of practice for designers within the proposed framework. This is about a design activism where the designer/researcher plays the role of social mediator activating, integrating and facilitating certain co-creative relational domains, which this work supports to be essential to further construct a culture of ecological sustainability.
This is a design led research that is exploratory and generative. It explores other domains of thought and practice to propose an ecological situation of design and also, a different context of action, skills and tools designers can develop to co-create alternatives to the emerging issues of this century. The experience with schools and the ideas generated in this practice were used to further support and validate the thesis’ theoretical reflections and are suggested as valuable to further approaches to this subject matter by designers.
The thesis was organized according to the research hypothesis that to promote ecological sustainability, including in design practice, are necessary three steps: 1. It is necessary to construct deep awareness about the causes and extent of our socio-ecological issues and widely share it, situating it within the scope of people’s understandings. 2. At the same time, it is also necessary to situate people, communities and human activity within an essentially ecological perspective able to co-creatively cope with the socio-ecological issues of this century. 3. In this process, designers together with other individuals in possession of different knowledge and abilities — from the mundane to the exoteric — will facilitate future thinking, or ecological imaginaries as a form of anticipation that can be followed by the craft, articulation and endeavor of viable habitats and ethos.
These are also possible skills to be introduced within designers’ educational domains. Everything that is proposed in this thesis is an agenda adopted to connect with people and to create networks within the municipality of Torres Novas that are intended to improve or to create transitional structures with people co-creating, promoting awareness on the need for change, and gradually exerting bottom up influence over political decision-making. The process does not end here, as this case is essentially the report of an ongoing design experience and agenda.
Keywords: Participatory Design; Ecological Thinking; Future Thinking; Education; Generative Research.