Apresentação

O atual estudo exploratório nasce do projeto “Desafios Globais”, promovido pelo CIDAC – Centro de Intervenção para o Desenvolvimento Amílcar Cabral e pela Fundação Gonçalo da Silveira (FGS). O seu objetivo principal é perceber quais as práticas de Educação para a Cidadania que são levadas a cabo em meio escolar em Portugal, em particular, compreender em que medida estas iniciativas se cruzam com o que se entende neste projeto por Educação para a Cidadania Global (ECG). Partindo deste levantamento de práticas, pretende-se refletir sobre o conceito de ECG, apoiando a sua reflexão conceptual em Portugal e também perspetivar novas abordagens de trabalho a médio prazo.

Neste estudo, assume-se que as iniciativas de ECG incluem um conjunto de critérios essenciais: i) a presença de um conjunto de valores éticos ligados à justiça social, solidariedade e equidade; ii) a promoção consciente e intencional do pensamento crítico; iii) a inter-relação de temas; iv) o foco nas causas estruturais dos problemas analisados; v) a análise das relações e interdependências entre o global e o local; vi) a motivação para a ação focada na transformação social e vii) a promoção do trabalho colaborativo entre todos os/as aprendentes (docentes, discentes e comunidade educativa). Estes critérios podem ser analisados a partir de 4 dimensões: a pedagógica, a dimensão de trabalho colaborativo, a dimensão ética e a dimensão política.

Ao nível metodológico, o estudo adotou como ponto de partida epistemológico a possibilidade de construção de saber a partir da experiência partilhada de todas as pessoas que foram envolvidos/as ao longo deste processo. Este documento não assume, por isso, para si um caráter generalizante das suas análises, nem de testagem de teorias ou visões teóricas sobre o que é a ECG e o seu papel na escola em Portugal. Assume-se antes como forma de desconstrução e reconstrução de uma realidade em constante mutação, a da ECG no nosso país, que se reitera como múltipla, plural e, como tal, em funcionamento através de comunidades de práticas que se vão colocando em diálogo, complementando e reforçando. A análise efetuada no quadro deste estudo pretende expressar a visão das organizações envolvidas, mais do que generalizar qualquer possível conceito de ECG, suas dimensões ou práticas.

Através de um questionário online, criado de raiz a partir das reflexões tidas no âmbito do projeto sobre a Educação para a Cidadania Global, foram analisadas 124 iniciativas, correspondentes a 98 estabelecimentos de ensino. Destes, 92% pertencem ao sistema público, e o seu conjunto representa todas as NUTS II do país, com exceção da Região Autónoma dos Açores.

A partir da análise realizada, assume-se aqui a ECG como um processo educativo, mais do que como um tipo de iniciativa. Enquanto processo educativo, a ECG pode ser posta em prática em qualquer disciplina ou contexto, com qualquer idade e público, desde que assuma um caráter crítico e dialógico que é trabalhado de forma continuada, que parta da realidade quotidiana dos/as participantes, que crie relações que reconstruam laços sociais não hegemónicos, que promova a utopia da identidade planetária, que se foque em valores de justiça, equidade e solidariedade e que relacione a possibilidade de agência humana com a necessidade de transformação social.

As conclusões do estudo encontram-se agrupadas em 5 eixos, refletindo: 1) a forma como a dimensão ética é integrada nas iniciativas desenvolvidas; 2) a preocupação relativamente à promoção do pensamento crítico, embora apenas focada nos/as estudantes; 3) a abordagem multitemática das iniciativas; 4) a forma como o trabalho colaborativo é colocado em prática; 5) o papel fundamental da ECG enquanto forma de (auto)perceção das relações de poder e opressão que pessoas e grupos sofrem e/ou reproduzem e a sua relativa ausência nas iniciativas analisadas.

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